Eólicas reduzem risco de racionamento

Eólicas reduzem risco de racionamento

Os ventos têm indicado o caminho para que o Brasil atravesse uma das estiagens mais severas da história, sem que falte energia elétrica nas casas da população. Entre junho e novembro, uma média de 20% do abastecimento elétrico nacional será suprido com a geração eólica. Esse volume recorde de geração é resultado da “safra dos ventos”, como é conhecido este período do ano, quando as rajadas se tornam mais constantes e fortes, em contraposição à redução das chuvas que afeta boa parte do País.

Se falta água nos reservatórios das hidrelétricas do Sudeste e Centro-Oeste, sobra vento nas costas do Rio Grande do Norte, da Bahia e do Rio Grande do Sul. É isso o que tem ajudado a equilibrar a geração de energia. O RN tem 22 empresas de geração de energia com projetos em operação, e já concentra 191 empreendimentos, com 2.444 aerogeradores, sendo líder nacional em potência instalada. Em junho passado, o RN atingiu a marca histórica de 5.574,8 megawatts (MW) em potência de energia com fonte eólica instalada, de acordo com o boletim Infovento da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica).

Atualmente, o Estado ainda tem 35 empreendimentos em construção (1.415 MW) e outros 84 contratados (3.324 MW). Somente no primeiro trimestre de 2021, seis novos parques eólicos entraram em operação, representando um crescimento de 6% na potência instalada do RN. Houve ainda aumento de 9% no número de empreendimentos em construção.

No início desta semana, 16% do consumo diário de energia em todo o País foi suprido pelos parques eólicos. Os aerogeradores já chegam a alimentar o consumo de um dia inteiro da Região Nordeste, como ocorreu em 22 de julho, conforme os dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). O recorde foi registrado pelo ONS, Operador Nacional do Sistema Elétrico, com geração média diária de 11.399 MW médios, representando 102% da demanda do Nordeste naquele dia. O recorde de geração média diária anterior havia sido registrado no dia 21 de julho, com 11.094 MW médios e atendimento de 99,9%.

O monitoramento do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) indicou que na última sexta-feira, 6 de agosto, houve a geração de 11.680 MW médios de energia eólica, representando 104,4% da demanda da região Nordeste naquele dia. O índice é 2,5% superior ao último, registrado em 22 de julho, quando foram produzidos 11.399 MW médios. No mesmo dia 6 de agosto, foi registrado também recorde de pico da fonte eólica, às 22h16, chegando a 12.805 MW naquele minuto. A máxima corresponde a 105,9% da demanda da região Nordeste. A fonte eólica é a terceira mais relevante da matriz elétrica brasileira e, de acordo com dados deste mês, representa 10,9%. A expectativa é que chegue ao fim do ano atingindo 11,2%.

A tendência é de crescimento. As estimativas apontam que, em horários de pico, as eólicas vão atender cerca de 23% do mercado total de energia do Brasil. Como o sistema de transmissão interliga todo o País, essa geração ajuda a reduzir a pressão sobre os reservatórios de hidrelétricas, que podem guardar mais água para tentar reduzir os impactos da pior crise hídrica dos últimos 91 anos.

“Atualmente as eólicas já abastecem, em média anual, cerca de 13% da demanda de energia no Brasil e, neste segundo semestre, essa média saltará para 20% de abastecimento. E não é só no Nordeste que os recordes são registrados. Embora tenhamos cerca de 80% da capacidade instalada nessa região, o Sul do Brasil também tem uma capacidade instalada importante”, diz Elbia Gannoum, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica).

Essa capacidade de colheita dos ventos é resultado dos investimentos pesados que o setor recebeu nos últimos anos. Há dez anos, a fonte eólica não passava de uma experiência dentro da matriz elétrica, com pouco mais de 900 megawatts de capacidade instalada em algumas dezenas de parques eólicos. Uma década depois, esse volume se multiplicou por 20 e já chega a 19 mil megawatts. São mais de 720 parques que, diariamente, colocam para girar 8.550 cataventos nos principais corredores de vento do território nacional.

No ano passado, o Brasil foi o terceiro país do mundo que mais ampliou sua capacidade de geração, com 2.297 megawatts adicionados em 2020, ficando só atrás da China e dos Estados Unidos. O setor recebeu cerca US$ 4 bilhões (aproximadamente R$ 21 bilhões) em investimentos em 2020. Considerado o período de 2010 a 2020, foram US$ 37,3 bilhões injetados nos parques eólicos.

“Neste período do ano, os ventos ficam mais fortes que a média, tendo um comportamento oposto às chuvas. Devido à seca, os ventos ficam mais fortes. Para produzir energia eólica, são necessários ventos estáveis, com a intensidade certa e sem mudanças bruscas de velocidade ou de direção”, diz Elbia Gannoum. “O Brasil tem a sorte de ter uma quantidade enorme desse tipo de vento, o que explica o sucesso da eólica no País nos últimos anos.”

Expansão da eólica já está contratada
O crescimento da geração eólica já está contratado. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) já homologou a construção de mais 163 parques eólicos no País. Serão injetados mais 5.445 megawatts de potência ao parque nacional. Como os leilões são realizados anualmente, esse volume tende a crescer. O Brasil, que até 2013 ocupava a 13ª posição no ranking mundial de geração eólica, fechou 2020 como o sétimo país que mais consome energia produzida pela força dos ventos, só atrás de China, Estados Unidos, Alemanha, Índia, Espanha e França.

Para o próximo Leilão de Energia Nova A-5, agendado para o dia 30 de setembro, o Rio Grande do Norte tem 37 empreendimentos de energias renováveis aptos a participar. Para viabilizar os projetos, o setor de Energias do Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (Idema), emitiu, em tempo hábil, 17 reemissões de licenças e 22 novas licenças ambientais para que as usinas localizadas em solo potiguar possa se cadastrar no leilão.

Conduzido pela Anell, o Leilão é destinado à contratação de energia elétrica a partir de fontes hidrelétricas, eólica, solar fotovoltaica e térmica a biomassa, a gás natural, carvão mineral e de recuperação energética de lixo urbano, com período de suprimento variando entre 15 e 25 anos.

No mês de abril, o Idema liberou licenças para viabilizar os projetos que participaram dos leilões A-3 e A-4, realizado no início do mês de julho, quando o Rio Grande do Norte ficou em primeiro lugar na compra de energia nova 2021, com previsão de entrega para 2024 (A-3) e para 2025 (A-4). Ao todo, foram contratados 350,6 megawatts (MW) em projetos de geração de energia no RN, tendo como principal fonte a eólica. O valor equivale a quase três vezes o contratado para o segundo colocado no leilão, que foi o estado de São Paulo, com 131 MW. A Paraíba ficou na terceira posição, com 100 MW. No RN, serão investidos R$1.427.253.000 na implantação dos projetos.

Para o Leilão A-5, dos documentos emitidos pelo Idema a grande maioria foi de Licenças Prévias para instalação de Parques Eólicos e Fotovoltaicos. Além deles, um projeto pioneiro para transformação de resíduos de aterro em energia.

Consumo de energia supera patamar pré-pandemia
Enquanto o nível dos reservatórios não para de cair, o consumo de energia elétrica vai na direção contrária e já supera o patamar pré-pandemia. Em junho, o consumo total do Brasil cresceu 12,5% em relação a igual período de 2020, sendo puxado sobretudo pelo setor industrial, com expansão de 19,4%, segundo dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE). No ano, o uso da eletricidade no País subiu 7,7% e deve continuar em alta nos próximos meses, apesar do crescente risco de desabastecimento.

Os setores comercial e residencial também tiveram reação, com altas de 19% e 4,9%, respectivamente. O consumo de energia no ano é superior ao verificado em 2019, antes da pandemia. Se por um lado esse aumento indica melhora na atividade econômica, por outro pode pressionar ainda mais o sistema elétrico. Até quarta-feira, o nível dos reservatórios do sistema Sudeste/Centro-Oeste, responsável por 70% da capacidade de armazenamento do País, estava em 24,64%, ante 28,92% de junho. Algumas hidrelétricas, como as da bacia do Rio Paranaíba, tinham volume de água abaixo de 15%.

“Diante de uma demanda em alta e oferta (água) em baixa, o risco é de não termos energia para todos em alguns horários do dia”, diz o professor da UFRJ Nivalde de Castro, coordenador-geral do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel). Ele destaca que alguns setores, como os eletrointensivos em energia (que gastam muita eletricidade), estão tendo uma retomada mais forte porque precisam recompor o estoque reduzido durante a crise sanitária.

O governo, que nega o risco de racionamento, pretende iniciar em 1.º de setembro programas desenhados para incentivar indústrias e consumidores residenciais a economizarem energia. Desde junho, o Ministério de Minas e Energia (MME) vem desenhando medidas voltadas para grandes consumidores que, voluntariamente, se disponham a reduzir ou evitar o consumo de energia em determinados horários. Mas, com o agravamento da crise, a pasta também planeja compensar consumidores residenciais que economizarem energia, o que provavelmente será feito com descontos nas contas de luz.

“Até o final deste mês, vamos apresentar um programa de resposta da demanda. O que isso significa? Que os grandes consumidores de energia e os residenciais também serão beneficiados, caso eles utilizem a sua energia em horários pré-determinados e isso será muito bom para o sistema e para redução do custo da energia”, disse o ministro Bento Albuquerque.

O presidente da Associação dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), Paulo Pedrosa, diz que, depois de definidos os parâmetros do programa, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) e a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) precisam fazer ajustes para iniciar o processo. Também é necessário tempo para as empresas se adaptarem e dizerem se vão ou não aderir ao programa.

Nem todos os setores têm condições de aderir ao programa. O setor químico, cujo consumo aumentou 25% em junho, trabalha em processo contínuo (24 horas por dia). Qualquer parada precisa ser planejada com muita antecedência, diz a diretora de economia e estatística da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), Fátima Giovanna Coviello Ferreira. Segundo ela, o terceiro trimestre é o melhor para o setor, que cresceu 9,7% no primeiro semestre.

O presidente da indústria de produtos de limpeza e higienização Start Química, Fábio Pergher, confirma as restrições. Segundo ele, hoje não é possível reduzir um único quilowatt de energia. “Estou precisando de mais energia para produzir. Se diminuir o consumo, comprometo todo o investimento já feito e tudo vira um caos.” Na empresa, só há parada para manutenção aos domingos. No setor têxtil, indústria que teve maior alta do consumo em junho (de 60%), nem todos os segmentos conseguem aderir ao programa. “Para a indústria têxtil, a redução não é factível, pois o trabalho é 24 horas. Já na de confecção há maior flexibilidade”, diz o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Fernando Pimentel. (AE)

Fonte: http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/ea-licas-reduzem-risco-de-racionamento/518224